terça-feira, 5 de abril de 2011

Aygadoux (Por Tony Belloto)

(Foto por MRossi/Divulgação)


De avó negra e pai francês, ela já ouvia bebê discos de ópera que a mãe amava. De aparência andrógina, sempre esteve mais para personagem de história em quadrinhos do que para estrela de Glam Rock. Como uma priminha (ou um priminho) punk do Tintim, por exemplo.
Começou a tocar violão e a cantar muito cedo. E logo aos oito anos compôs uma canção que seria um hit devastador 15 anos mais tarde. Conseguiu de certa forma amalgamar numa só voz as emissões das duas principais cantoras da geração anterior à sua: a transcendência etérea de Marisa Monte com a urgência bestial de Cássia Eller. Tudo isso com um despojamento que a distancia ainda mais das divas afetadas (e meio patéticas) de outras e outras gerações (menos Elza Soares). Sua aparente fragilidade pode ser só um truque da Natureza para esconder tamanha determinação (e indiscutível vozeirão).
Distraída, foi vencendo. E batendo uma viola pra Gilberto Gil nenhum botar defeito. Tocou em barzinhos e outros buracos que povoam as entradas alternativas do Inferno (a entrada principal é sempre muito disputada, cheia de filas e casas de espetáculo que lembram Las Vegas). Fez uns carinhos na cabeça de Cérbero ― que, estranhamente, não rosnou à sua presença.
Dizem que o que acalmou a fera foi a audição de “Ne me quitte pas” ao pé do ouvidão. A mim ela seduziu com a interpretação de “O trem das onze”. “Essa música é muito triste”, disse depois, com seu jeitinho doce (surpreendente para alguém que parece ter aprendido a viver sob os códigos de Hamurabi das esquinas e as leis de Talião das ruas). E assim me rendo ao talento e à simpatia de Maria Gadú, a tradução pública de Mayra Corrêa Aygadoux, uma brasileira, oi.

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